História e Evolução da Medicina Fabio Yuji

O caso H.M. : O Homem Sem Novas Memórias – Casos Famosos da Medicina

Olá, queridos leitores do ABC da Medicina!

Hoje vamos falar um pouco sobre um dos casos mais famosos de toda a medicina moderna: o paciente "H.M.". Como vocês devem saber, muitas das descobertas da medicina acontecem por acaso, e esse é um dos exemplos mais famosos desse fato. O estudo do caso desse paciente contribuiu imensamente para o desenvolvimento da neurociência, principalmente em relação ao funcionamento da memória. Ficou curioso? Então, vamos descobrir quem foi "H.M."!

Quem foi H.M. ?

"H.M.", na verdade, são as iniciais de Henry Molaison, um cidadão norte-americano, nascido na cidade de Manchester em 1926. Durante sua infância (a partir dos 10 anos), Henry sofreu de episódios recorrentes de crises epilépticas focais. Alguns de seus parentes alegam que as crises começaram após um acidente de bicicleta sofrido por ele aos 7 ou 9 anos. Quando Henry completou 16 anos, suas crises começaram a aparecer com mais frequência e se generalizaram, manifestando-se como crises tônico-clônicas, que são o tipo mais conhecido de epilepsia, em que o indivíduo apresenta espasmos musculares generalizados, perde o controle de seus esfíncteres e perde a consciência.

Henry Molaison, o famoso

Henry Molaison, o "H.M."

Sua epilepsia piorou de tal forma que Henry foi declarado incapacitado para trabalhar em 1953, com apenas 27 anos, mesmo tentando o tratamento com medicação anticonvulsivante. Por causa disso, um neurocirugião chamado William Scoville se ofereceu para fazer uma cirugia experimental em Henry com o intuito de curar sua epilepsia. Após alguns testes, Scoville deduziu que a "origem" das crises de H.M vinha dos lobos temporais mediais dos dois hemisférios cerebrais. O tratamento proposto foi, então, realizar uma cirurgia de resecção dessas regiões encefálicas. H.M. e sua família consentiram com o procedimento.

Quais foram as consequências da cirurgia de H.M. ?

Dr. Scoville retirou partes do lobo temporal conhecidas como hipocampo, amígdala e uncus dos dois hemisférios cerebrais de H.M.. A princípio, a cirurgia parecia ter sido bem sucedida, porque foi constatado que H.M. tinha melhorado muito em relação a suas crises epilépticas. Porém, logo ficou claro que o procedimento de resecção cerebral havia deixado uma sequela neurológica muito grande em H.M: o paciente desenvolveu uma amnésia anterógrada gravíssima. Isso significa que H.M. não conseguia mais consolidar nenhuma memória nova de fatos que aconteciam após a sua cirurgia.Hipocampo: região cerebral responsável por consolidar memórias

Hipocampo: região cerebral responsável por consolidar memórias

Também houve um pequeno comprometimento de memórias passadas de H.M, principalmente de sua infância, caracterizando uma amnésia retrógada. Porém esta não era nem de perto tão grave quanto sua amnésia anterógrada. Apesar dessa incapcidade de formar novas memórias, o restante da capacidade intelectual de H.M permaneceu relativamente intacto, sendo preservada sua habilidade de raciocínio. Além disso, outros tipos de memória não foram comprometidas em H.M. como, por exemplo, a "memória de trabalho" (capacidade de reter informações por pouco tempo, apenas para elas serem utilizadas em uma tarefa em andamento) e também a habilidade de aprendizado motor (apesar de H.M. não conseguir se lembrar como havia adquirido essa nova habilidade).

O que a neurociência aprendeu com o caso H.M. ?

O caso H.M., sem dúvidas, é um dos mais estudados da história da neurociência. O artigo publicado por Dr. William Scoville e Dra. Brenda Milner (uma das maiores neurocientistas de todos os tempos, que contribuiu no estudo de Henry Molaison) em 1957 continua sendo citado extensivamente até os dias de hoje.

A contribuição mais óbvia e imediata do caso é que o lobo temporal está envolvido na consolidação de memórias episódicas. Na época não se podia ter certeza (uma vez que foram retiradas várias regiões do lobo temporal), mas depois de outros casos, hoje já se sabe que o hipocampo é a principal região envolvida nesse processo. O caso H.M. foi fundamental nessa dedução porque o paciente não possuia problema alguma antes da cirurgia e, após o procedimento de resecção bilateral do lobo temporal, começou a apresentar esse déficit.

Mais do que isso, talvez o principal ensinamento que o estudo do caso proporcionou foi o de que os diversos tipos de memória são adquiridos e processados por processos diferentes e em regiões cerebrais predominantemente distintas. O fato de Henry ter perdido a capacidade de consolidar memórias de episódios ocorridos após sua cirurgia, mas ter preservado outros tipo de memória como a memória de trabalho ou o aprendizado motor foi algo que ensinou muito aos neurocientistas. Hoje em dia, já se tem muito mais conhecimento sobre os processos que governam cada tipo de memória, mas na época essa descoberta foi totalmente fantástica e inesperada.

E o que aconteceu com H.M. ?  

Para vocês que ficaram curiosos de saber o que aconteceu com Henry Molaison: ele morreu em 2008, com 82 anos de idade! Ele gostava de fazer palavras-cruzadas, mas só conseguia completar com palavras que havia aprendido antes de sua cirurgia. Após a sua morte, a Universidade da Califórnia de Davis ficou com o seu cérebro para realizar pesquisas anátomo-patológicas e os resultados estão sendo divulgados até hoje.

Esperamos que tenham gostado de saber sobre o caso H.M, um dos pacientes mais importantes para o avanço do conhecimento neurocientífico! Deixem seus comentários e nos contem o que acharam do post!

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1 Comentário

  1. Sthela disse:

    Muito interessante… assim como a medicina… fascinante!

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