O Livro Memórias Póstumas de Brás Cubas é uma das Obras primas de um dos maiores escritores mundiais, e que com muito orgulho é brasileiro, Machado de Assis. A partir do Vestibular de 2013 a Fuvest e Unicamp, bem como muitas outras instituições incluíram esse Romance em sua Lista de Leituras Obrigatórias, o que para os que apreciam literatura foi um presente!
Mesmo para aqueles que ainda não vão prestar vestibular a leitura desse Clássico é muito importante, e para ajudá-los a entender melhor o romance, fiz esse Resumo / Resenha de Memórias Póstumas com descrição de capítulos e trechos, características e Análise da Obra.
Aproveite também para deixar seus comentários ou dúvidas sobre a Obra da Fuvest e Unicamp aqui em meu Blog…
Escola Literária e Contexto
O romance Memórias Póstumas de Brás Cubas foi publicado em 1881 e foi o marco inicial do Realismo brasileiro, escola Literária que teve como principal característica o racionalismo e cientificismo em oposição total aos princípios estilísticos do Romantismo (em que os heróis eram idealizados, sublimes e movidos por sentimentos extremados).
Nesse contexto, houve duas vertentes do Realismo, a Psicológica da qual Machado de Assis foi o principal expoente – nela o foco da obra não são as ações em si, mas o modo como as personagens veem e sentem as circunstancias que vivem; e a Naturalista a qual tem como principal autor Aluísio Azevedo (com O Mulato e O Cortiço) – nela as ações humanas aparecem determinadas pelo meio, tempo e hereditariedade, e em geral o homem aparece animalizado.
Ambas vertentes realistas tem o foco no determinismo e crítica social, embora o Realismo Psicológico tenha enfoque na visão de mundo dos personagens, expondo suas contradições (como podemos ver na pessoa de Brás Cubas e também em Bentinho de Dom Casmurro), ou seja aborda em profundidade a individualidade e caráter dos personagens.
Descrição das Personagens e Resenha de Memórias Póstumas de Brás Cubas
A personagem central da Obras é Brás Cubas, um narrador-personagem que na verdade é um defunto autor, pois começa a contar sua historia apos ter morrido. Quando vivo tratava-se de um homem rico, que menino era muito traquinas e até malvado, digamos assim, pois montava num negrinho (o Prudencio) e fazia dele seu cavalo, chegou a quebrar a cabeça de uma escrava por que esta não lhe deu doce, entre tantos outros feitos principalmente narrados no Capítulo 11 (O Menino é o Pai do Homem).
Desde os cinco anos merecera eu a alcunha de “menino diabo”; e verdadeiramente não era outra coisa; fui dos mais malignos do meu tempo, arguto, indiscreto, traquinas e voluntarioso.
Viveu diversas aventuras na adolescência, como seu namoro com a espanhola Marcela – mulher que adorava receber joias e outros presentes, tinha vários admiradores e que no final da obra teve um final trágico (primeiro ficou desfigurada por causa de um surto de Bexiga, e depois morreu magra e decrepita na maior miséria). No trecho abaixo veja um pouco da ironia do autor ao lembrar-se da amante:
Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis; nada menos.
O pai, que amava por demais o filho desde a meninice nunca repreendeu seus atos traquinas (chamava-o de brejeiro e dava-lhe beijos, e tinha sonhos de o filho ser alguém ilustre o manda estudar Direito em Portugal. Em Lisboa, ele vive muitas aventuras, forma-se e so’ retorna ao Rio de Janeiro quando recebe uma carta dizendo que sua mãe esta mal e quer vê-lo.
Apos a morte da mãe, Cubas é instruído pelo pai a se casar e ingressar no ramo da política, a noiva indicada era Virgília, bela filha de Dutra um homem influente na época. Da-se um pequeno namoro, mas surge a figura de Lobo Neves que acaba arrebatando-lhe a noiva e consegue cargos administrativos, ele prometia fazer Virgília Baronesa/Marquesa (aqui o autor mostra que a mulher fora movida e atraída por interesses sociais), ambos se casam e Cubas, que ainda não a amava deveras, sente apenas despeito e vaidade ferida ao perder a namorada.
Neste ínterim, Brás Cubas vai visitar Dona Eusébia (que em outro tempo fora flagrada, pelo menino Cubas, beijando um senhor casado, Doutor Vilaça, numa Moita) e encontra-se com sua filha Eugenia, chamada por ele maliciosamente como a Flor da Moita, ha’ um certo flerte entre os moços, mas este finda-se quando Cubas descobre que ela é coxa. Veja a reflexão do narrador no capítulo 33 (Bem-aventurados os que nao descem):
O pior é que era coxa. Uns olhos tão lúcidos, uma boca tão fresca, uma compostura tão senhoril; e coxa! Esse contraste faria suspeitar que a natureza é às vezes um imenso escárnio. Por que bonita, se coxa? por que coxa, se bonita? Tal era a pergunta que eu vinha fazendo a mim mesmo ao voltar para casa,de noite, e não atinava com a solução do enigma
Apos os desfortúnios (perda da noiva e da candidatura) do filho, o pai de Brás morre. Segue-se uma briga entre irmãos (Brás e Sabina, já casada com Cotrim) sobre os bens da Herança, a qual fara’ com que fiquem brigados por um bom tempo. O narrador passa por uma fase, que se repetira’ no final do romance, de vazio combinado com orgulho e individualismo. Veja reflexão do autor no capítulo 49 (A Ponta do Nariz):
A conclusão, portanto, é que há duas forças capitais: o amor, que multiplica a espécie, e o nariz, que a subordina ao indivíduo. Procriação, equilíbrio.
Quando Virgília volta de São Paulo, casada com Lobo Neves, Cubas a reencontra num baile, dançam uma valsa e por fim acabam se apaixonando. Fica claro, no capítulo 53 (…) como se deu esse amor:
Há umas plantas que nascem e crescem depressa; outras são tardias e pecas. O nosso amor era daquelas; brotou com tal ímpeto e tanta seiva, que, dentro em pouco, era a mais vasta, folhuda eexuberante criatura dos bosques.
Complementado pelo capítulo 56 (Momento Oportuno):
Um dia vimo-nos, tratamos o casamento, desfizemo-lo e separamo-nos, a frio, sem dor, porque não houvera paixão nenhuma; mordeu-me apenas algum despeito e nada mais.Correm anos, torno a vê-la, damos três ou quatro giros de valsa, e eis-nos a amar um ao outro comdelírio. A beleza de Virgília chegara, é certo, a um alto grau de apuro, mas nós éramos substancialmente os mesmos, e eu, à minha parte, não me tornara mais bonito nem mais elegante. Quem me explicará a razão dessa diferença?
Assim, Brás Cubas e Virgília, vivem momentos de amor e perigo, afinal era uma relação de traição, chegam até a alugarem uma casa para se encontrarem a qual era cuidada por Dona Placida (filha de uma Doceira e de um cônego – que apenas sofre na vida).
Resumindo bastante, seguem-se mais fatos como a eleição de Lobo Neves a Presidência de uma província no Norte (mas como foi decretada num dia 13, por superstição Neves a recusa); a morte de Viegas, um Velho rico que Virgília bajulava a fim de faze-lo deixar uma herança a seu filho, o qual morre sem deixar-lhe nada e sendo ganancioso até o ultimo suspiro; Cubas reencontra-se com Quincas Borba, amigo de infância que acaba por desenvolver uma Filosofia (o Humanitismo); tentativa de Sabina de arrumar uma noiva para Cubas (filha de Damasceno, chamada Eulália que terá um triste fim por ser assolada com um epidemia e morrer aos 19 anos); ocorrem também suspeitas públicas e de Neves quanto a traição.
Por fim, Lobo Neves aceita um nova candidatura a Presidência, Virgília e Cubas separam-se e desta vez foi o fim do romance entre eles – o autor mostra que no final nem sentiu tristeza, foi algo como um ponta de alívio e saudade.
O Romance é finalizado por uma sequencia de desatinos na vida de Cubas, que não foi ministro, não alcançou o sucesso na politica, nem no emplasto contra Hipocondria, nem se casou (Sequencia mostrada no ultimo capítulo – Das Negativas). Percebe-se assim como sua vida fora vazia e despropositada, mas que pelo menos não passou a diante o legado da miséria humana:
Este último capítulo é todo de negativas. Não alcancei a celebridade do emplasto, não fui ministro,não fui califa, não conheci o casamento. Verdade é que, ao lado dessas faltas, coube-me a boa fortuna denão comprar o pão com o suor do meu rosto. Mais; não padeci a morte de Dona Plácida, nem asemidemência do Quincas Borba. Somadas umas coisas e outras, qualquer pessoa imaginará que nãohouve míngua nem sobra, e conseguintemente que sai quite com a vida. E imaginará mal; porque ao chegara este outro lado do mistério, achei-me com um pequeno saldo, que é a derradeira negativa deste capítulode negativas: – Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado da nossa miséria
Características da Obra; Análise e Comentários do Romance Realista Memórias Póstumas (…)
* Inovações da Obra: quanto a Temática, a Estrutura da Narração e a Linguagem. O autor abandona o romantismo, investe na complexidade dos indivíduos que são retratados sem nenhuma idealização (Machado mergulha na alma humana, desvendando seus vícios, virtudes e defeitos). A lógica narrativa do romance é determinada não pela cronologia dos fatos, mas pelo encadeamento de reflexões do personagem.
Outra inovacao foi a dedicatória do livro:
AO VERME QUE PRIMEIRO ROEU AS FRIAS CARNES DO MEU CADÁVER DEDICO COMO SAUDOSA LEMBRANÇA ESTAS MEMÓRIAS PÓSTUMAS
* Intertextualidade – Machado de Assis faz inúmeras referencias em sua Obra, como a Shakespeare, Virgílio, Voltaire e tantos outros. São citações a pensamentos, filosofias e romances escritos. Vê-se aqui uma das tantas influências que o autor sofreu da literatura de Almeida Garrett, especialmente comparada a obra Viagens na Minha Terra, pois ambos desenvolvem diálogo com o leitor, intertextualidade, metalinguagem, digressões, ironia e críticas.
* Digressões e Metalinguagem – através das digressões (ou seja interrupções do fluxo narrativo por devaneios, reflexões, relatos da memória, etc) o defunto autor fornece informações para conhecer a visão de mundo de um homem que passou a vida sem realização nenhuma, apenas ao sabor de seus desejos.
Ao usar a metalinguagem, o autor interage com o leitor dialogando diretamente com ele, assim convida-o a refletir sobre a estrutura da obra e a perceber dois níveis de leitura: a que revela diretamente o personagem e a que o faz objeto de crítica do autor.
* Ironia e Crítica – são marcas da obra madura de Machado de Assis, trata-se de um recurso que o autor utiliza para fazer o leitor desconfiar das declarações, dos pensamentos e das conclusões do narrador Brás Cubas, bem como um instrumento de critica aos valores adotados pelos homens (como a Opinião, a Formalidade, etc).
* Humanitismo – filosofia desenvolvida por Quincas Borba (que vai tornando-se louco progressivamente) a qual prega que tudo o que acontece na vida faz parte de um quadro maior de preservação da essência Humana. No contexto do romance, o Humanitismo convém a Brás para justificar sua existência vazia, e a Quincas da’ uma ilusão de descoberta do sentido da vida.
Segundo críticos, o Humanitismo é ” uma caricatura que Machado de Assis faz do Positivismo e do Evolucionismo, teorias científicas e filosóficas em voga na época, que atribuem sentido de evolução mesmo `as fatalidades da vida.
* Ha’ uma certa dose de Determinismo (as origens e meio em que as pessoas vivem as propulsionam a certos destinos), como exemplo temos o caso de Dona Placida, fruto de uma relação vulgar e que vive sempre `a miséria.
Dessa conjunção de luxúrias vadias brotou Dona Plácida. E de crer que Dona Plácida nãofalasse ainda quando nasceu, mas se falasse podia dizer aos autores de seus dias: – Aqui estou. Para queme chamastes? E o sacristão e a sacristia naturalmente lhe responderiam: – Chamamos-te para queimar osdedos nos tachos, os olhos na costura, comer mal, ou não comer, andar de um lado para outro, na faina,adoecendo e sarando, com o fim de tornar a adoecer e sarar outra vez, triste agora, logo desesperada,amanhã resignada, mas sempre com as mãos no tacho e os olhos na costura, até acabar um dia na lamaou no hospital; foi para isso que te chamamos, num momento de simpatia.
* Entre os Capítulos que considero Principais e marcantes, temos o cap. 1 (Óbito do Autor) que abre o romance com a morte do personagem-narrador que reflete sobre ser um autor defunto ou defunto autor, além das circunstancias da morte. Tem-se aqui um estilo inovador na literatura, tanto pela temática como pela forma da escrita.
O Cap. 7 sobre o Delírio em que o autor reflete sobre o homem, sua existência, o passar dos seculos e a miséria humana na perseguição inútil da Felicidade.
Ao contemplar tanta calamidade, não pude reter um grito de angústia, que Natureza ou Pandoraescutou sem protestar nem rir; e não sei por que lei de transtorno cerebral, fui eu que me pus a rir, – de umriso descompassado e idiota.- Tens razão, disse eu, a coisa é divertida e vale a pena, – talvez monótona – mas vale a pena.Quando Jó amaldiçoava o dia em que fora concebido, é porque lhe davam ganas de ver cá de cima oespetáculo. Vamos lá, Pandora, abre o ventre, e digere-me; a coisa é divertida, mas digere-me.A resposta foi compelir-me fortemente a olhar para baixo, e a ver os séculos que continuavam a passar, velozes e turbulentos, as gerações que se superpunham às gerações, umas tristes, como osHebreus do cativeiro, outras alegres, como os devassos de Cômodo, e todas elas pontuais na sepultura.
Cap 71 – O senão do Livro – em que o autor dirige-se aos leitores dizendo que o defeito do livro é na verdade dos leitores que tem pressa de lê-lo, fazendo assim um crítica direta ao estilo romântico dos folhetins que eram marcados pela ação e clímax.
Começo a arrepender-me deste livro. Não que ele me canse; eu não tenho que fazer; e, realmente,expedir alguns magros capítulos para esse mundo sempre é tarefa que distrai um pouco da eternidade. Maso livro é enfadonho, cheira a sepulcro, traz certa contração cadavérica; vício grave, e aliás ínfimo, porque omaior defeito deste livro és tu, leitor. Tu tens pressa de envelhecer, e o livro anda devagar; tu amas anarração direita e nutrida, o estilo regular e fluente, e este livro e o meu estilo são como os ébrios, guinam àdireita e à esquerda, andam e param, resmungam, urram, gargalham, ameaçam o céu, escorregam e caem.
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Comentários
Ver comentários (14)
Parabéns pela resenha! E obrigado por compartilhar seus conhecimentos conosco, espero que você seja aprovada na Fuvest! Abraço.
Incrível o seu resumo! eu li a obra,é realmente maravilhoso o livro.
Obrigada pelos elogios...esse livro é realmente muito bom e cheio de reflexões sobre o ser humano (Machado é chamado de o Bruxo e de o Agudo da Alma Humana, por conta desse estilo inovador de escrever...)
continuem acessando meu Blog... caso tenham dúvidas ou mais comentários sobre o Livro mandem para cá =)
Como foi a morte de Brás Cubas
muito bom! me ajudou muito, e garanto que não encontrei resenha melhor. Obrigada!